A Califórnia é um paraíso da viticultura que origina vinhos ricos e prazerosos há mais de 100 anos. Além de ser uma Meca para os produtores de Chardonnay e Cabernet Sauvignon de alto nível, possui um rico terroir gerando estilos tão distintos quanto os encontrados na Europa. Quer conhecer por que os vinhos californianos fazem tanto sucesso de público e crítica? Então, descubra agora.
Primeiro segredo
Os Estados Unidos são o quarto maior país vinicultor do mundo, sendo a Califórnia responsável por 94% da produção. É o primeiro maior consumidor mundial de vinho em volume, à frente da França e Itália, mas apenas o 56o no consumo mundial per capita com impressionantes 10 litros por ano segundo o relatório da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), www.oiv.int. Há cerca de 2.800 vinícolas, porém o mercado é dominado por poucos grandes produtores.
As regiões vinícolas se dividem em mais de 100 zonas chamadas Áreas Viticultoras Americanas (AVAs). Algumas cobrem um condado inteiro; outras menos de 100 ha. Diferentemente dos sistemas AOC ou DOC europeus, as AVAs são apenas designações geográficas, sem critérios qualitativos.
Como os estilos de vinhos não são regulamentados, a indústria depende do mercado e, por vezes a produção pode exceder ou não atender à demanda – como ocorreu em 2003, quando a superprodução culminou no arranque de dezenas de milhares de hectares na Califórnia. Ainda assim, os períodos de instabilidades tendem a ser curtos.
Uvas tintas
A Cabernet Sauvignon é sem dúvida a cepa tinta mais importante da Califórnia, constituindo quase ¼ das uvas tintas do estado. Em segundo lugar estão empatadas há alguns anos a Zinfandel e a Merlot. A primeira quase se extinguiu há 20 anos, sendo salva pela invenção do vinho rosado e a última conquistou grande popularidade nos anos de 1990, porém sua reputação foi maculada por muitos vinhos fracos de safras altas. Os vinhos californianos tintos costumam ser calcados na fruta e de estilo rico, quase corpulento, e com álcool relativamente alto em função do clima.
Zinfandel: a vinha californiana autóctone
A cepa Zinfandel é um fascinante cartão de visitas da Califórnia. Sua origem parece ser croata, e é idêntica à Primitivo do sul da Itália, mas na Califórnia ganhou personalidade própria. Foi vastamente cultivada por imigrantes, sobretudo italianos, que se fixaram na Costa Norte no séc. XIX, produzindo vinhos robustos e encorpados que lembravam os do sul da Europa. Muitos desses vinhedos antigos ainda sobrevivem: por não serem irrigados, a produtividade é baixa, e as uvas têm sabor intenso.
Uvas brancas
A Chardonnay é a número 1 entre as uvas brancas. Rica e opulenta, sempre foi popular. Outras, como Viognier, Roussanne, Pinot Gris e Riesling, geram vinhos excelentes, mas em volumes mínimos comparados com os da Chardonnay. Só a Sauvignon Blanc é alternativa viavél em termos de quantidade.
Segundo segredo
Os primeiros plantadores de vinhas foram os missionários espanhóis que chegaram por volta de 1770. Em meados do séc. XIX, imigrantes italianos e alemães cultivaram as altas encostas ensolaradas buscando reproduzir a paisagem europeia, e logo muitas áreas produziram vinhos bem sucedidos comercialmente. Então, o duplo golpe da filoxera no fim do séc. XIX e da Proibição do álcool no início do séc. XX destruiu a indústria vinícola. Os americanos, porém, não se deixaram abater, e com o fim da Proibição, a Califórnia foi se recuperando gradualmente.
Filoxera: a praga
A Phylloxera Vastatrix é um pulgão minúsculo que quase destruiu a indústria vinícola europeia. Nativo do leste da América do Norte, o afidídeo devastador de vinhedos foi introduzido acidentalmente no sul da França através de vinhas americanas importadas nos anos de 1860, espalhando-se pela Europa. As vinhas infectadas eram arrancadas e queimadas. Essa endemia e sua solução mudaram para sempre o cultivo de vinhas.
Solução criativa
Nos anos de 1870, o botânico francês Jules-Emile Planchon e o cientista inglês Charles Riley, entomologista do estado do Missouri, acharam a solução para a praga: enxertar os sarmentos produtores das vinhas europeias nos raizames das americanas resistentes à filoxera.
O enxerto é um procedimento simples. A raiz de uma espécie norte-americana, como a Vitis riparia, é presa ao sarmento da cepa europeia Vitis vinifera. Quando plantado, o raizame resistente à filoxera sustenta e protege os ramos que produzem frutos.
A maioria das vinhas do mundo é plantada assim, e são necessários grandes esforços para garantir seu sucesso. As diferentes combinações de variedades de raizames e sarmentos também são levadas em conta.
Proibição do álcool
Para quem não sabe, no período de janeiro de 1920 a dezembro de 1933, tornou-se ilegal a produção e venda de bebidas alcoólicas nos Estados Unidos. Essa experiência foi reflexo de várias forças históricas e culturais, mas extremamente prejudicial para a vitivinicultura do país. Após esses 14 anos de “seca”, houve uma grande influência na relação dos Estados Unidos com o álcool e seu legado é um complexo aparato legal que regula sua comercialização.
A indústria permaneceu pequena até os anos de 1960, quando teve início o grande renascimento dos vinhos californianos. O famoso vinicultor Robert Mondavi abriu sua vinícola em 1966, e no início dos anos de 1970, dois vinhos californianos obtiveram surpreendente vitória sobre os cuvées franceses no chamado Julgamento de Paris, o que deu sinal verde aos enólogos da Califórnia.
Terceiro segredo
Julgamento de Paris: Em 1976, o comerciante de vinhos britânicos Steven Spurrier organizou uma degustação às cegas que confrontou os melhores vinhos californianos e os grandes Bordeaux e Borgonha, e os jurados, na maioria franceses, preferiram um Cabernet Sauvignon da Stag’s Leap Wine Cellars e um Chardonnay do Château Montelena. Os franceses ficaram inconformados quando o feito chegou à imprensa internacional. A competição foi comprometida pelo fato de só ter incluído safras recentes, e os vinhos franceses são menos expressivos quando jovens do que os californianos. Ainda assim, o julgamento provou que a produção do Vale do Napa tem relevância no mundo do vinho e deve ser sempre respeitada.
AVAs importantes
A rica região do Vale do Napa está longe de ser a maior, porém é merecidamente a mais celebrada, com encorpados Cabernets Sauvignons comparáveis aos melhores bordeaux. Mas, o surpreendente é que 95% da sua produção é de responsabilidade de vinícolas familiares.
Das outras regiões importantes, Sonoma tem a maior diversidade de clima e uvas; Monteray é ideal para Chardonnay e Riesling; Santa Barbara tem mostrado potencial para fantásticos Chardonnays, Pinots Noirs e Sirahs; e o interior, mais rural, produz Zinfandels e fortificados corpulentos nos Sopés da Sierra e um grande volume de vinhos básicos porém saborosos no escaldante Vale Central.
A Costa Norte estende-se de São Francisco para o norte e abrange quatro condados: Vale do Napa, Sonoma, Mendocino e Lake. Em geral, as AVAs correspondem a entidades geográficas coerentes, mas em Sonoma os limites são mais complicados, e algumas AVAs, caso do Vale Green, Chalk Hill, são de fato sub-regiões da AVA Vale do Rio Russian, enquanto a AVA de Sonoma Coast, vasta extensão litorânea, cobre o condado de norte a sul.
Vinícolas boutiques
Há hoje mais de 800 vinícolas entre Mendocino, ao norte, e Malibu, ao sul, além do interior, desde vinícolas boutique que produzem algumas centenas de caixas por ano até grandes empresas industriais, como a Ernest & Julio Gallo e a Beringer Class. Com mais de 200.000ha de vinhedos, a Califórnia gera 94% do vinho americano.
Anders-Lane Artisan Wines
A vinícola californiana Anders-Lane Artisan Wines, tem excelentes rótulos produzidos na região do Vale do Napa. Um dos destaques é o Estrada Creek Zinfandel, com 90% Zinfandel e 10% Carignan. De característica e sabor intenso, com notas de cerejas, especiarias e pimenta negra. Ideal com pastas com molhos vermelhos, queijos fortes e carnes grelhadas.
Bogle Winery
Uma outra vinícola da Califórnia é a Bogle Winery, que produz em Monterey/Lodi/Sonoma o surpreendente Bogle Pinot Noir, com 100% Pinot Noir. Vinho elegante e complexo. Possui notas de frutos silvestres, hortelã, especiarias, lavanda, baunilha e tostado. Vai bem com queijos envelhecidos, patês, cogumelos, aves e suínos. A safra 2014 possui o Certificado Lodi Rules for Sustainability, um plus em se tratando de seu excelente custo-benefício.
Outro memorável é o Bogle Petite Sirah, com 100% Petite Sirah. No nariz, notas de especiarias e amoras maduras. Na boca, final aveludado e longo com tons de carvalho tostado, couro e cacau devido ao estágio de 10 meses em barris novos de carvalho americano. É o ícone da vinícola e vai harmonizar com carnes de caça, cordeiro, vermelhas e arroz de pato.
Se quiser ir além, nas suas experiências enogastronômicas, escolha o Bogle Phantom e conheça todo o potencial das uvas que o compõe na medida certa: 39% Zinfandel, 38% Petite Sirah e 23% Cabernet Sauvignon. Aromas de pimenta preta, notas de zimbro, especiarias e baunilha tostada por causa dos 24 meses estagiando em barris novos de carvalho americano. Paladar explosivo devido aos taninos macios no início, seguido de uma certa mineralidade e por fim uma sensação persistente. Combina com pratos picantes, carnes de cordeiro e vermelhas.
Sua seleção não ficará completa sem o Bogle Essential Red, do corte das uvas Old Vine Zinfandel, Sirah, Cabernet Sauvignon e Petite Sirah. Um vinho complexo, com notas de cerejas doces e frutas maduras. Baunilha, nuances de especiarias e tabaco na boca por estagiar 10 meses em barris de carvalho francês e americano. Acompanha queijos envelhecidos, patês, pratos com cogumelos, aves e suínos, e por exemplo um belo risoto de funghi.
Quarto segredo
A localização privilegiada permite aos vinhos californianos nascerem em um dos terroirs mais valorizados das Américas. Lembrando os terrenos da Toscana, na Itália, uma tranquilidade de interior impera na região quando as vinhas estão na entressafra da colheita. Seu segredo maior é a impressionante amplitude térmica que ocorre no mesmo dia, além da variedade enorme de solos vulcânicos diferentes em uma área pequena, trazendo alguma mineralidade em alguns de seus vinhos.
O pequeno centro de Sonoma recebe turistas o ano inteiro e possui infraestrutura completa para atendê-los com o melhor da gastronomia, lazer e compras. Essa área compreende 240km2, com 400 vinícolas e 18 AVAs, inclusive as conhecidas Sonoma, Alexander, Dry Creek e Vale do Rio Russian.
Mendocino County, localizada a noroeste de Sonoma, é a terra da Pinot Noir, porém só 5% do vinho da Califórnia vem dessa área premium porque o grande volume é produzido no centro do Estado. No entanto, chega a produzir 50% da uva Pinot Noir. Tem 13 AVAs e 90 vinícolas.
O legendário Vale do Napa contempla 16 AVAs e 520 vinícolas. Seu terroir é um dos menores do país e engarrafa apenas 4% dos vinhos californianos, mas que representam 27% de todo capital gerado pela bebida no estado. É considerado uma das mais charmosas regiões vinícolas do planeta, com vocação para receber mais de 3,5 milhões de pessoas que amam o mundo do vinho, principalmente por estar tão próxima à cosmopolita São Francisco. Mais informações: www.VisitNapaValley.com e www.visitcalifornia.com.
A Wine Lovers, tem vinhos californianos dessas regiões para você começar a explorar por completo os verdadeiros segredos escondidos dentro de cada garrafa produzida. Entre eles, das vinícolas da região do Vale do Napa e vale Dry Creek; Burnside Road, Owl Ridge Vineyards, Pezzi King Vineyards e Willowbrook, todos da região de Sonoma. Venha descobrir esses achados incríveis!
Espetacular esse post. Uma aula sobre os vinhos da Califórnia. Amei!!!
Oi, Celia. Legal que gostou! O melhor agora é beber um dos nossos incríveis vinhos californianos e comprovar na prática as infos do artigo…